A pandemia foi uma das maiores disrupções já vistas na história mundial. Tanto que ainda vivemos imersos nela e em suas consequências anos depois de seu início. A partir da Covid-19, renovar, inovar e readaptar foram palavras que se tornaram lei para empresas que buscaram continuar fortes no mercado. Mercado esse que se tornou ainda mais competitivo.
Muitas marcas precisaram se reinventar, como a Natura, que criou uma plataforma de vendas online para suas consultoras; e a Magalu, que implementou uma plataforma digital para que trabalhadores autônomos possam abrir lojas virtuais e revender produtos da empresa. A cadeia de suprimentos global também sofreu um impacto gigante em meio a isso, forçando muitas empresas a repensar sua atuação. Um exemplo destacado foi a falta de semi-condutores em escala global, e que serve de matéria-prima para a fabricação de chips usados nos mais diversos aparelhos eletrônicos, como smartphones, videogames e computadores. Essa falta acertou em cheio a indústria automotiva, por exemplo, gerando um efeito na ponta ao diminuir a produção de carros novos, aumentando seu preço e aquecendo, por tabela, o mercado de seminovos e usados.
Fato é que, por mais que a pandemia seja mais saliente como grande evento disruptor, esse tipo de fenômeno não é de hoje. Desde muito tempo atrás, a disrupção no ambiente externo é uma dura realidade no ambiente de negócios. Tanto que, mal saímos de uma e já temos outra: a guerra da Rússia contra a Ucrânia. É uma disrupção dentro da disrupção. Guerra dentro da pandemia. Todo esse conflito sangrento instaurado há mais ou menos um mês já demonstra consequências em todos os sentidos, especialmente no setor energético e de commodities, que são os tipos de setores que provocam reação em cadeia ao longo de diversas outras indústrias.
Isso sem falar de toda a questão da exclusão da Rússia das relações comerciais, que faz com que empresas precisem se movimentar, até por uma questão de imagem e reputação. Com o cancelamento global da Rússia, ninguém mais está querendo fazer acordos com o país e diversas multinacionais precisam se reequilibrar com um mercado a menos e toda a questão operacional para lidar.
O fato é que, quando essas disrupções ocorrem, geralmente, surgem os efeitos cascata em diversas situações e áreas econômicas e de negócios, que forçam empresas a mudarem seu rumo para se manterem vivas. É interessante olhar para esse cenário pela ótica da adaptabilidade necessária para que as empresas, de fato, não desistam ou morram no meio do caminho. Vamos falar sobre como as disrupções externas afetam as estratégias e como se adaptar a estes cenários.
AS 11 MACRO FONTES DAS INTERRUPÇÕES
Segundo a publicação MIT Sloan Management Review , existem 11 fontes de interrupções, que estão fora das mãos de um líder, e que abrangem:
1. Distribuição de riqueza: a distribuição de renda entre os domicílios de uma população, a concentração de ativos em várias comunidades, a capacidade dos indivíduos de ascenderem de suas circunstâncias financeiras existentes e a lacuna entre os grupos superiores e inferiores dentro de uma economia.
2. Educação: acesso e qualidade da educação primária, secundária e pós-secundária; treinamento da força de trabalho; aprendizagem comercial; programas de certificação.
3. Infraestrutura: estruturas físicas, organizacionais e digitais necessárias para o funcionamento da sociedade.
4. Governo: órgãos governamentais locais, estaduais, nacionais e internacionais, ciclos de planejamento, eleições e decisões tomadas.
5. Geopolítica: relações entre líderes, militares e governos de diferentes países e risco enfrentado por investidores, empresas e líderes. Aqui é que entra o conflito de Rússia e Ucrânia, por exemplo, que acaba gerando disrupções em outras áreas, como a economia.
6. Economia: mudanças nos fatores macroeconômicos e microeconômicos padrão.
7. Saúde pública: mudanças que ocorrem na saúde e no comportamento da população de uma comunidade. A pandemia se encaixa aqui também.
8. Demografia: taxas de natalidade e mortalidade, renda, densidade populacional, migração humana, doenças e outras dinâmicas.
9. Meio ambiente: mudanças no mundo natural ou áreas geográficas específicas. A produção agrícola está incluída nesta categoria.
10. Mídia e telecomunicações: todas as maneiras pelas quais enviamos e recebemos informações e aprendemos sobre o mundo. Alô, metaverso!
11. Tecnologia: tecido conjuntivo que liga negócios, governo e sociedade.
Essa pode parecer uma lista excessivamente ampla de sinais a serem rastreados para se preparar para o futuro, mas, ignorar essas fontes potenciais de mudança deixa as organizações vulneráveis a disrupções.
O CASO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS AFETADA PELA PANDEMIA DE COVID-19
A pandemia mostrou ser um verdadeiro teste de valores e propósitos no mundo dos negócios. As cadeias de suprimentos carecem de resiliência global e estão entrando em colapso diante de interrupções em vários países. Cada vez mais caras (por exemplo, menos custos de atendimento global e de comércio eletrônico), muitas vezes representam os custos mais altos de uma empresa.
Os impactos significativos que as cadeias de suprimentos e operações têm no planeta e na sociedade não atendem às expectativas dos stakeholders quanto à sustentabilidade. As lacunas de talentos em toda a cadeia de suprimentos e operações continuam a criar alta dependência da força de trabalho humana. A falta de flexibilidade inibe a capacidade de atender às demandas dos clientes por personalização e customização. Os sistemas de TI continuam a ser caros de executar, inflexíveis e muitas vezes dependentes de tecnologias legadas.
Como responder à disrupção na cadeia de suprimentos?
Os líderes de negócios devem tomar decisões rápidas e medidas imediatas para sustentar as operações para atender seus clientes, bem como proteger e apoiar seus funcionários. As cadeias de suprimentos reaproveitadas e remodeladas do futuro precisarão ser caracterizadas tanto pela resiliência, quanto pela responsabilidade. Isso ajudará comunidades a gerenciar crise de curto prazo e permitirá que empresas se desenvolvam em torno de seus clientes e ajudem economias a se recuperarem.
Organizações precisam enfrentar desafios operacionais e financeiros ao mesmo tempo em que atendem de forma rápida às necessidades de colaboradores, clientes e parceiros. Ao responderem os impactos imediatos da pandemia e se prepararem para disrupções futuras, um ciclo contínuo de mobilização, detecção, análise, configuração e operação de riscos ajudará a otimizar resultados e mitigar riscos.
A pandemia não é apenas uma crise de curto prazo. Há uma necessidade de as empresas construírem resiliência de longo prazo. Isso requer abordagens holísticas para gerenciar a cadeia de suprimentos. As marcas devem construir flexibilidade para se proteger contra interrupções futuras e considerar o desenvolvimento de uma estrutura robusta, que inclua capacidade de operações de gerenciamento de risco responsiva e resiliente.
Tudo isso deve ter como base a tecnologia, alavancando plataformas que suportam análises aplicadas, Inteligência Artificial e aprendizado. Além disso, é importante assegurar transparência no processo. A longo prazo, a resposta ao risco precisará se tornar parte integrante dos protocolos de negócios.
Analisando um case hipotético de uma indústria do papel higiênico
As cadeias de suprimentos foram impactadas de forma significativa na pandemia. Os fabricantes tiveram aumento na demanda, mas, por outro lado, o fornecimento de matérias-primas para produzir diminuiu. Mesmo assim, foi possível superar. Para exemplificar, elencamos um case hipotético com estratégias que visam melhorar o nível de serviço durante um surto de pandemia para os produtos mais procurados, como papel higiênico.
Vamos ao exemplo: o nível de serviço da venda de papel higiênico caiu significativamente devido à escassez de matérias-primas, fornecimento limitado de emergência e aumento significativo da demanda. Para superar, quatro estratégias foram adotadas:
Compartilhar recursos entre fabricantes
Essa estratégia faz parte das cadeias de suprimentos flexíveis, em que todos os fabricantes de um país devem colaborar, compartilhar recursos e produzir uma única marca do item. Aqui, as companhias são obrigadas a fazer isso durante uma pandemia para um item essencial e de alta demanda, como papel higiênico, considerando que atender aos indivíduos e comunidades é uma responsabilidade social de todos.
Usar de fontes coletivas de emergência
Os fabricantes de um país exploram coletivamente, em vez de individualmente. Juntos, eles podem buscar o fornecimento de um novo local de onde não é viável para o fabricante individual obter materiais.
Produzir itens básicos de qualidade
Aqui, os fabricantes oferecem itens de qualidade básica, em vez daqueles premium, durante a pandemia, para aumentar o volume de produção. Por exemplo: no caso do papel higiênico, serão feitos rolos de uma folha em vez de duas ou três. Isso permite que empresas atendam mais clientes.
Embalar o produto com um tamanho mínimo padrão
Nessa estratégia, os fabricantes vão embalar os itens com um tamanho mínimo padrão para aumentar o número total de pacotes e atender mais clientes. No exemplo de papel higiênico, os fabricantes produzirão uma embalagem com quatro rolos em vez de 12, 24 ou 48.
O estudo também sugere que as indústrias deste segmento produzam itens básicos de qualidade e com tamanho padrão do pacote durante a pandemia para melhorar o serviço. Essas estratégias aumentam a probabilidade de que os itens necessários sejam distribuídos de forma uniforme e mais pessoas sejam atendidas. Além disso, o governo e os formuladores de políticas devem apoiar essas ações para superar a escassez de oferta.
ANTÍDOTOS PARA LIDAR COM DISRUPÇÕES
A Pesquisa Global de Crise de 2021, da PwC, revelou que 7 em cada 10 organizações estão planejando aumentar o seu investimento em resiliência e 95% dos líderes empresariais dizem que suas capacidades de gerenciamento de crises precisam ser aprimoradas, tudo isso devido à pandemia.
Essa Era de Disrupção traz novas dificuldades, oportunidades e riscos para as empresas. O potencial para crises se intensificou – impulsionado pela rápida mudança tecnológica e amplificado pelas expectativas da sociedade em torno do ESG. Com base nesses insights, entram em cena 10 considerações para iniciar uma discussão crucial e oportuna sobre o tema, para aumentar a preparação para crises nesta era de ruptura:
1. Reconheça que você está cada vez mais exposto aos riscos digitais
Dado que a maioria das organizações está se tornando empresas centradas em tecnologia ou dados, você pode enfrentar uma crise desencadeada por vários novos riscos digitais: introdução de novo software, atualizações de TI necessárias ou um evento cibernético, como um ataque de ransomware. Considere seu novo ambiente de risco digital e construa seu planejamento de crise por meio dessa lente.
2. Construa resiliência, prepare-se para crises
Todas as organizações precisam se preparar para a disrupção. Pode ser liderada por incidentes ou liderada por problemas, mas qualquer interrupção terá impactos em uma organização. A capacidade de navegar com sucesso por essa interrupção depende de:
-
Resiliência: ter planos e recursos robustos implementados para garantir que as organizações possam resistir, absorver ou se recuperar de qualquer interrupção para garantir que não cause impactos intoleráveis; e planos para apoiar a continuidade e a recuperação quando a prevenção não é possível ou é falha.
-
Preparação para crises: quando os arranjos de resiliência são inadequados, falham ou são sobrecarregados (normalmente devido à escala ou natureza da interrupção), sendo capaz de cumprir os objetivos estratégicos da organização e retornar a um estado operacional viável.
Fundamentalmente, as organizações precisam começar a se preparar para a disrupção agora, para que as lacunas possam ser identificadas e fechadas com cuidado, preparação e prática.
3. Integre seus programas de crise e resiliência para gerenciar a disrupção
Revise seus sistemas, partes interessadas e a estrutura de crise atual – não é uma tarefa fácil, considerando as propriedades de tecnologia, parceiros de negócios e terceiros, normalmente extensos de hoje. Existem dependências ocultas ou lacunas que podem prejudicar uma resposta coesa? E se sua crise fosse ligada a um problema maior de provedor de serviços? Se um evento de alta velocidade e alto impacto atingisse você amanhã, sua organização seria operacionalmente resiliente? Qual é o seu grau de confiança na capacidade da sua organização de resistir a interrupções sustentadas – e emergir mais forte?
4. Prepare-se para gerenciar seus problemas para evitar crises
As organizações se beneficiariam ao reconhecer que as questões não devem ser gerenciadas como de costume; se não forem gerenciados, podem ser desencadeados por um evento externo (por exemplo, um denunciante) e se transformar em uma crise. Trate os problemas com o mesmo grau de seriedade de uma crise causada por incidentes, como um evento climático.
Revise a capacidade de sua organização para identificar e gerenciar problemas. Uma capacidade de gerenciamento de problemas não precisa ser complexa e deve ser simples para conduzir a tomada de decisão eficaz e rápida para obter controle – gerencie um problema com uma estrutura clara, procedimentos e caminhos acordados para escalação – antes que eles possam ameaçar os objetivos estratégicos de sua empresa.
5. Revise sua estrutura de resposta a crises
Estruturas de resposta a crises de três camadas bem estabelecidas, como ouro-prata-bronze ou estratégicooperacional-tático, têm seu lugar. No entanto, é importante reconhecer que o cenário de risco atual exige que os gerentes de crise evoluam suas estratégias de preparação.Essa estrutura de três camadas pode não ser ágil o suficiente para uma resposta organizacional eficaz a crises impulsionadas pela tecnologia ou, de fato, ser apropriada para estruturas organizacionais cada vez mais enxutas e ágeis.
Para permitir uma tomada de decisão rápida ao responder a crises de tecnologia ou digitais, considere estabelecer uma estrutura alinhada às categorias de impacto, com proprietários responsáveis claros, em vez de uma resposta em três níveis.
6. Reúna os estrategistas técnicos e tomadores de decsiões estratégicos
Quando se trata de crises, especificamente aquelas com impactos tecnológicos, menos pode ser mais. Isole um pequeno grupo de pessoas designadas que tenham o conhecimento, a capacidade de fazer a triagem do evento e a autoridade para tomar decisões rapidamente. Normalmente, isso exigirá uma cooperação estreita entre os tecnólogos – que têm as informações sobre as quais as decisões podem ser tomadas – e os principais membros seniores da organização, que têm o poder de tomar essas decisões.
7. Nomear um especialista no assunto de dados e ter uma estratégia de dados de crise em vigor
Para muitas organizações, um dos desafios mais significativos durante a COVID-19 foi a dificuldade em coletar dados para informar e apoiar sua resposta – especificamente sua tomada de decisão e comunicação com as partes interessadas. Em uma crise, os gerentes devem tomar decisões cruciais rapidamente – e essas decisões dependerão da disponibilidade, precisão e abrangência das informações. Certifique-se de ter uma estratégia de dados específica para crises. Ele deve permitir que você acesse rapidamente grandes volumes de dados estruturados e validados, em ritmo acelerado, e tenha um plano de como visualizar esses dados para informar a tomada de decisões rápidas em uma crise.
8. Sinta-se à vontade para falar cada idioma do outro
Se houver pontos cegos, silos ou fraturas por estresse entre seus grupos operacionais e a liderança, você pode ter certeza de que uma crise os exporá no pior momento possível. Evite falhas na comunicação: aproxime os líderes organizacionais da tecnologia da qual a organização depende, ao mesmo tempo em que cultiva tecnólogos “com experiência em salas de reuniões”. Isso também vale para relacionamentos com terceiros e organizações recém-adquiridas. A prática e o teste de estresse reúnem as equipes para aprender a linguagem uns dos outros e construir a memória muscular.
9. Planeje para o maior, aprenda com o menor
Em ‘tempo de paz’, reúna seus donos de impacto e explore seus cinco principais riscos em equipe. Planeje cenários de alto impacto, interrupções extensas e longos prazos de recuperação. Desenvolva manuais e guias de decisão para preparar sua equipe de gerenciamento sênior. E certifique-se de tratar incidentes menores como sinais de alerta que podem ajudá-lo a identificar padrões e aprofundar sua compreensão dos riscos que você enfrenta. Use ferramentas como exercícios e jogo s de guerra para explorar sua estratégia e tomada de decisões contra seus cinco principais riscos.
10. Agarre as oportunidades escondidas na crise
Entenda que na era da disrupção, ‘negócios como sempre’ na verdade significa ficar para trás. Mesmo antes de a crise ser resolvida, a energia disruptiva em seu centro pode ser aproveitada para obter vantagens estratégicas. Visualize – e priorize – emergindo como uma organização mais ágil e melhor habilitada para tecnologia, mas também promova os laços de equipe que se formarão.
Reinvente-se. Adapte-se. Sobreviva.
Ou vai ou racha. 8 ou 80: essas frases e esses bordões conhecidos nunca fizeram tanto sentido em um texto de estratégia como esse. Isso quer dizer o quê? Que disrupções sempre existiram e vão continuar a acontecer pro resto da vida, ou você se adapta ao cenário, ou já era.
Os negócios que conseguem lidar com crises, entender o que está passando, criar estratégias de valor mesmo em tempos de risco, inovar e se reinventar são os que melhor se adaptam ao momento, sobrevivendo e se mantendo competitivo no segmento de atuação.
Interrupções afetam empresas, destrilham caminhos, atrapalham processos. Mas, quando se tem a chave para resolver os problemas, tudo se encaminha para dar certo, e a sobrevivência é certa.