Em 1991 nasceu a, hoje icônica, IDEO, uma empresa de design – aparentemente, como tantas. Ao longo de sua trajetória, foi acumulando cases importantes como o primeiro mouse da Apple. Ficou famosa a história de como eles prototiparam a ideia do produto com uma manteigueira e um desodorante roll-on para ilustrar o movimento da bolinha [não, nem sempre houve sensor óptico nos mouses].
Quase 20 anos depois do nascimento, o fundador, Tim Brown escreveu um livro chamado Change By Design, com o objetivo de explicar, conceituar e sistematizar as bases do pensamento e do approach de como um designer resolve um problema. A intenção era tirar o método apenas dos designers e “exportá-lo” para o mundo de negócios e para a sociedade de maneira mais ampla, como uma forma de pensar e trabalhar que todo mundo poderia recorrer para tentar resolver um problema.
Corta a cena, posts-its invadem a vida, workshops pipocam a cada esquina e o design thinking toma todo mundo de assalto, sendo o grande ícone contemporâneo de criatividade ou método criativo. Uma revolução.
Aqui, vamos tentar voltar para o livro que deu start nesse boom e recordar dos princípios fundamentais que Brown tentou estabelecer.
Desconstrução do estereótipo sobre criatividade
Provavelmente uma das maiores contribuições gerais de Tim Brown no livro seja a desconstrução do estereótipo do criativo como um gênio, como alguém que tem uma espécie de talento ou aptidão natural e vai trazer da cartola uma solução incrível, que ninguém tinha percebido, só ele, o gênio.
Isso porque, ao criar um processo criativo mais sistematizado, que parte de algumas bases como divergência e convergência, processos mais formais de observação, geração de insights, ideação e protótipos, fica disponível para qualquer pessoa a prerrogativa de atuar criativamente. Não existe um processo seletivo que barra tipos de pessoas que podem ou não podem participar de um workshop de design thinking.
E isso não só desconstrói a ideia de “tipos de pessoas” como empodera qualquer um a se arriscar e participar de processos de inovação. E isso é algo muito importante como resultado geral da disseminação mais ampla do pensamento de design.
“Design thinking taps into capacities we all have but that are overlooked by more conventional problem-solving practices. It is not only human-centered; it is deeply human in and of itself.”
A necessidade do porquê
No livro Brown menciona que qualquer projeto ou pensamento de inovação precisa ter a palavra “why” no seu centro, e presente em todos os momentos. Criar algo novo tende a ser muito mais poderoso quando enfrenta o status quo.
Então, ser curioso sobre por que as coisas funcionam como funcionam e por que não poderiam ser diferentes é o motor que alimenta todo o processo. Uma pessoa passiva, que se acomoda ou que não se incomoda com determinadas realidades, com certeza vai ter mais dificuldade para criar algo novo e interessante.
Empatia e Observação: as pessoas no centro
Em termos de approach para um problema, talvez a característica mais forte do design thinking seja partir do princípio que as pessoas são o centro de tudo. Não é sobre o mercado, sobre o que a empresa tem o desejo de vender porque vai ser bom para ela. É sobre o que as pessoas precisam para que a vida delas melhore.
Claro que ler essa frase pode soar absolutamente ingênua fora de contexto e sem senso crítico. Porque é óbvio que o motivador geral de toda inovação de mercado parte da lógica capitalista de lucro. Porém, a ideia de colocar as pessoas no centro do processo é a crença do design thinking sobre aquilo que, sim, potencialmente gerará maior lucro, por ter mais chance de ser desejado pelas pessoas.
Portanto, o Design Thinking de Brown parte da lógica de que o designer precisa gerar empatia com o seu público, se colocar nos sapatos dele e tentar viver a experiência pelos olhos e mãos dele. Só assim ele poderá entender com mais clareza os pontos de dor das pessoas e ter a chance de trazer soluções inovadoras.
“The evolution of design to design thinking is the story of the evolution from the creation of products to the analysis of the relationship between people and products, and from there to the relationship between people and people.”
Pensar com as mãos
Hoje em dia é mais simples pensar na ideia de protótipos, porque vivemos [ainda bem] na era do test and learn, do MVP etc. Então já temos um pouco mais culturalmente estabelecida a ideia de que a falha é algo aceitável e ela vai nos permitir aprender e evoluir.
Mas há 10 anos essa noção não era bem difundida e a ideia era muito mais a de acertar do que a de poder errar e aprender com isso. E, nesse aspecto, Brown e seu Change By Design ajudaram muito.
Conceitualmente, sua ideia é que pensar com as mãos é melhor do que pensar com a cabeça. Quando você está só elaborando mentalmente uma ideia, fica muito difícil de entende-la em toda sua dimensão prática e concreta. Não dá para imaginar o que vai acontecer no uso a partir de um pensamento abstrato. E o uso é definidor da ideia em si. Então, não é que se faz um protótipo para “colocar a ideia de pé” e sim para aprender sobre o que aquela ideia é ou não, na prática.
Para designers isso sempre foi muito comum, um modus operandi. Mas para o ambiente corporativo de maneira geral, é uma mudança de paradigma bem importante.
“The faster we make our ideas tangible, the sooner we will be able to evaluate them, refine them, and zero in on the best solution.”
Ambiente que inspira inovação
Talvez a manifestação mais tangível ao primeiro olhar [literalmente no caso] da mudança cultural provocada pelas proposições de Design Thinking seja a transformação estrutural e visual dos ambientes de trabalho.
Hoje temos escritórios muito mais modernos, salas com lousas, equipadas com post its, canetões, ausência de baias, salas com paredes de vidro… tudo isso pode parecer só uma modernização estética, mas ela manifesta uma perspectiva de um ambiente que inspira criatividade e colaboração.
A inovação só surge em ambientes em que as pessoas se sintam livres para pensar, falar, colaborar, experimentar e errar. Então, quanto mais agradável, aberto e convidativo é o espaço, mais possibilidade as pessoas terão de atuar criativa e inovadoramente.
Então, não é sobre ter cadeira de praia, parede colorida e videogame. É sobre pensar um espaço que convide a pessoa intuitivamente a ser livre para criar.
Dez anos depois, podemos ver manifestações muito concretas e presentes que o Design Thinking inaugurou. Claro que, como tudo que se populariza, há também um grande nível de superficialidade e não entendimento sobre os princípios, o que leva potencialmente à banalização do método.
Aí, de um lado, temos os apaixonados que acham um jeito de colocar design thinking em tudo, como uma espécie de santo graal milagroso. E de outro quem já trata o método com o cinismo hipster de achar que já é popular demais e que por isso tem menos valor.
Tirando o 8 e o 80 da jogada, é fato que toda essa maneira de pensar tem valores fundamentais no nosso modo de resolver problemas e enfrentar o grande desafio que é inovar com qualidade.