[Série de artigos] Estratégia em uma palavra: Jogo

por Daniel de Tomazo

por Daniel de Tomazo

“Estratégia é fazer escolhas sobre a forma de vencer um jogo”

Eu amo essa definição. Pra mim, nenhum outro jeito de explicar o que é estratégia é tão forte e preciso. Isso, por causa de duas palavrinhas ali no meio: “escolhas” e “jogo”. Da primeira, vamos falar na semana que vem. Hoje o assunto é o jogo.

Na teoria, é fácil enxergar a relação entre Estratégia e um Jogo. Na prática, nem tanto.

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Eric Rasmussen é PhD, professor e autor de um livro importante sobre Teoria dos Jogos. Ele diz que um jogo tem 4 elementos essenciais: jogadores, ações, payoffs e informação.

Se um jogo é definido por esses 4 elementos, não é difícil perceber uma relação direta entre isso e a estratégia. Jogadores são os concorrentes, quem está disputando um mercado. Ações são os movimentos, o que cada um faz. Payoffs são os resultados das ações, positivos ou negativos. Informação é o que cada um sabe para decidir.

Pense, por exemplo, nessa disputa pela streaming de TV (o Felipe Senise, meu sócio na Sandbox, escreveu um artigo muito legal sobre o tema). Netflix, Amazon Prime Video, Apple e Disney+ são os jogadores. Quando Apple e Amazon baixam o preço, ou a Disney+ lança uma série original no universo Star Wars, está fazendo um movimento, uma ação. Se todo mundo fala do bebê Yoda e corre pra assinar e assistir, é um payoff. Tudo que a Netflix aprendeu com a liderança sobre o comportamento do consumidor de streaming, é uma informação que só ela tem.

Enfim, é fácil usar a mesma linguagem para um jogo e uma discussão estratégica. Não é à toa que as metáforas de futebol fazem tanto sucesso nas salas de reunião.

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O nó não está na linguagem, mas na mentalidade. Quem entra no jogo é para tentar ganhar. As pessoas gastam saliva discutindo os players e do que cada um faz, mas quase nunca param fazem uma pergunta simples: como é que a gente ganha? Isso vai dar certo de verdade? Aliás, a gente sabe mesmo que cara tem a vitória?

O mesmo cara da frase que abre esse texto, tem outra muito boa pra explicar esse ponto:

“Eu tenho percebido que a maioria dos líderes não gosta de fazer escolhas. Eles preferem manter suas opções abertas. Escolhas forçam a sua mão, geram pressão e um nível desconfortável de risco. Eu também percebi que poucos líderes podem, de verdade, definir o que é uma vitória. Como efeito, deixando opções abertas e não fazendo escolhas, esses líderes estão optando simplesmente por jogar, e não por ganhar. Eles acabam se acomodando na média da indústria, na melhor das hipóteses.”

Eu já estive nessa sala de reunião e você, provavelmente também. Um monte de gente junta; muito trabalho; muito postit na parede e fosfato sendo queimado. Tudo isso para discutir um projeto que, na melhor das hipóteses, só vai otimizar o status quo. Tudo isso, só para se adequar às melhores práticas do mercado.

A Apple não pode se dar ao luxo de lançar um serviço de streaming só porque os outros têm. Num certo sentido, o futuro dela depende disso. A Disney, toda poderosa, está colocando todas as fichas no seu próprio serviço porque, se não der certo, ela está na lama. A verdade é que jogar de “igual pra igual” não resolve nada.

Estratégia de verdade só acontece quando a gente lembra que está num jogo. E pensa em ganhar, não só em jogar pra empatar.

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Antes de terminar, preciso deixar uma coisa clara. Se essa conversa sobre “ganhar” te deixa um pouco desconfortável, eu te entendo.

Primeiro, eu também não sou fã de palestrinha de coach de araque. Nesse texto, vencer um jogo não é sobre não é motivação nem é emocional. Meu ponto é que a discussão sobre como vencer um jogo deveria ser mais objetiva — ainda que desconfortável. O que não falta é gente empolgada querendo chegar lá, sem fazer a menor ideia do que isso significa. Quer ser empolgado, beleza. Mas o que faz diferença de verdade é uma ideia clara do que é vitória. Do que pode, de verdade, dar certo.

Outro incômodo é que, quando a gente fala de vencer um jogo, imediatamente pensamos em impor uma derrota a alguém. E aí, a gente fica desconfortável de falar do assunto, se sentindo meio vilão de novela da Globo. Ainda bem que a vida não é um jogo de soma zero. Encarar estratégia como um jogo não significa olhar a vida com um olhar mesquinho, de escassez. Um bom jogo é feito de competição e de colaboração. A melhor estratégia é quando a gente ganha e faz muita gente ganhar junto.

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Esse texto é o primeiro de uma série chamada “Estratégia em uma palavra”. A cada semana, uma nova palavra pra ajudar a entender o que o é estratégia e como pensar mais estrategicamente.

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