Da série clássicos: Igor Ansoff, o pai da gestão estratégica

Talvez você nunca tenha ouvido falar nesse nome, mas Igor Ansoff é um dos “founding fathers” de gestão e estratégia nos EUA. Na década de 60, escreveu um dos clássicos que começou a mudar a maneira dos gestores pensarem seus negócios: Corporate Strategy: An Analytic Approach to Business Policy for Growth and Expansion.

Quando se fala em Ansoff, normalmente tudo o que se lembra é a sua famosa matriz de crescimento, que vamos falar um pouco aqui também. Mas as ideias do matemático russo radicado nos EUA vão bem além disso. Conceitos como a separação entre questões estratégicas, administrativas [ou táticas] e operacionais, a ideia de sinergia entre diferentes áreas, o conceito inovador na época de cenários turbulentos ou mesmo de gestão estratégica em tempo real. Tudo isso é o que dá a Ansoff, com alguma justiça, a alcunha de “pai da gestão estratégica”. Ainda assim, é largamente desconhecido fora da academia, ficando a margem de nomes como Porter e Drucker.

Mas não estamos aqui para corrigir injustiças históricas e sim para falar de ideias. E separamos três delas para explorar um pouco melhor a cabeça de Igor Ansoff.


Níveis de planejamento

Hoje em dia todo mundo consegue separar bem na sua cabeça o que significam os níveis de decisão estratégicos, táticos e operacionais. Mas quem primeiro sugeriu isso foi Igor Ansoff.

E depois de quase 60 anos pode parecer banal, mas na época era absolutamente esclarecedora a ideia de que existe um tipo de decisão que é estratégica porque diz sobre escolhas que definem caminhos, rumos e moldam o futuro da empresa. Outros tipos de decisão e tarefas são táticas [ou administrativas como ele chamava] porque tem a ver com a organização e o suporte à execução daquilo que vai fazer com que a estratégia ganhe vida. É a parte mais “planejamento” da história. E, por fim, decisões e ações que são operacionais, que dizem respeito a de fato realizar as tarefas que vão colocar tudo isso para andar de forma prática.

Se essa clareza de o que é o que, fica muito difícil para um gestor conseguir lidar bem com as suas equipes e os seus próprios skills. Separar esses assuntos e essas decisões é um salto de qualidade de clareza gigantes para o exercício de gestão.

Turbulência

Talvez essa seja a ideia que mais diferencie Ansoff de sus pares acadêmicos. Após uma cenários pós-guerra em que o mercado começou a ganhar cada vez mais players em praticamente todos os setores, Ansoff percebeu como seria praticamente impossível fazer qualquer análise ou tomar qualquer decisão sem entender o nível de competitividade e “turbulência” de determinado mercado.

Assim, ele elencou 5 níveis de turbulência que precisariam ser compreendidos por qualquer gestor:

  1. Repetitivo: um mercado em que pouca coisa muda, em que produtos, serviços e dinâmicas de consumo não sofrem grandes alterações, em que não há uma competitividade muito acirrada, ainda que haja vários players. Museu é um exemplo.

  2. Em Expansão: mercados que crescem rapidamente, em que a demanda é maior que a oferta e as necessidades dos consumidores ainda são básicas e não muito diferenciadas.

  3. Transformativo: são mercados em que as necessidades das pessoas estão se sofisticando e a diferenciação por marca acaba fazendo mais diferença do que a capacidade produtiva

  4. Descontinuidade: mercados em que mudanças em diferentes níveis acontecem mais rápido do que a própria capacidade da empresa em responder e o futuro é difícil de prever.

  5. Surpreendente: mercados em que as tecnologias avançam rapidamente e as pessoas estão dispostas a pagar mais pela tecnologia avançada. É uma corrida por pesquisa, desenvolvimento e inovação.

O interessante no pensamento de Ansoff é que cada um desses cenários de turbulência precisa ser acompanhado por um tipo de postura organizacional e uma resposta estratégica. Então, no fundo, as escolhas de como se deve gastar energia e recursos é muito calcada nessas características de turbulência do contexto em que se está inserido.

A Matriz Ansoff

Não poderia ficar de fora o framework mais famoso de Ansoff, na forma de uma matriz 2×2 [sempre] que diz sobre as formas de crescimento de uma empresa em determinadas circunstâncias.

É bem simples de entender, na verdade. Partindo da ideia da turbulência dos mercados e das formas que a empresa tem de crescer, Ansoff imaginou um eixo em que ele pensa em tipos de mercado, novos ou já existentes. De outro, pensa nos próprios produtos da empresa, que podem ser igualmente novos ou já existentes.

Então, há 4 possibilidades de estratégia aqui colocadas:

  • Em mercados já existentes, produtos já existentes estão na briga por penetração do mercado

  • Em mercados já existentes, produtos novos precisam passar por um processo de desenvolvimento, P&D, inovação

  • Em mercados novos, produtos já existentes precisam construir esse mercado, criar nele a demanda, fazer da forma mais literal possível o “marketing”

  • Em mercados novos, produtos novos precisam buscar diversificação, entendendo que está sendo criada uma nova necessidade para algo que nunca existiu e alguém que nunca comprou

Paralysis by analysis

Após um tempo do lançamento do Corporate Strategy, começou a haver uma crítica de que o método de Ansoff estaria produzindo muita lentidão nas empresas, que gastavam muito tempo analisando tudo o que era necessário para entender as três dimensões estratégicas, táticas e operacionais, além de fazer toda a análise de ambiente externo para entender as turbulências. Era bastante coisa.

Ele entendeu e absorveu a crítica, mas na forma de uma recomendação em uma expressão que hoje é famosa e repetida: paralysis by analysis. Ansoff quis dizer que sim as análises são importantes, mas elas não podem produzir uma paralisia na empresa, não pode travar. E desde então buscou simplificações e métodos mais ágeis de tomada de decisão, sem deixar de considerar aquilo que é necessário.

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É verdade que muita coisa de Ansoff caiu pelo caminho na medida em que o mundo e as teorias foram avançando. A própria matriz hoje parece não dar conta da complexidade de formas de crescimento possíveis. Mas é inegável que suas contribuições são gigantescas para o campo. E coisas que são absolutamente incorporadas por qualquer pessoas que começa a trabalhar na área são frutos de pensamentos disruptivos de Ansoof na sua época. Revisitar de quando em quando faz bem que só.