A formulação do problema e a chave da solução

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Art Markman é PhD e professor de psicologia e marketing na University of Texas, em Austin, além de dirigir [e ter fundado] o programa “Human Dimensions of Organizations”. Ele costuma escrever sobre lógica, motivação e tomada de decisão, como em seus livros “Smart Thinking”, “Smart Change” e “Habits of Leadership”. 

Em um texto publicado da Harvard Business Review, ele aborda um tema que não cansamos de voltar da Sandbox: definição de problema. Mas faz isso em uma perspectiva que também abordamos bastante, que é a da linguagem.

E isso porque – também como vivemos repetindo nas aulas – estratégia é uma atividade completamente abstrata. As pessoas que desenvolvem produto conseguem toca-lo ao final do trabaho. Quem cria uma campanha publicitária pode mostrar um filme de 30” e as pessoas podem assisti-lo. Quem cuida de canais pode entrar fisicamente em uma loja.

E estratégia?

Estratégia não. É algo que começa e acaba no mundo das ideias. É um conjunto de escolhas, uma lógica, uma linha de raciocínio. E o máximo que ela pode se tornar concreta é em termos de linguagem. As palavras, faladas ou escritas, são o máximo que uma estratégia pode atingir de concretude. Há o visual também, claro, mas ainda assim, não rompe o limite da linguagem.

Nesse sentido, gostamos muito de uma frase que é atribuida a Sócrates [talvez sem nenhum motivo, mas vá lá]:

“A sabedora começa na definição dos termos”

E isso vale completamente para estraégia. Com termos imprecisos e mal definidos, não há estratégia que consiga ser efetiva ou sobreviva à multiplas interpretações ao longo do caminho. Aliás, quanto mais perto da execução, mas essa falta de definição clara é sentida na pele, porque a coisa vai se perdendo e se perdendo.

E é nessa esteira que entra o texto de Art Markman. Porque ele fala sobre como o enunciado do problema é a chave da sua solução, ou seja, a maneira como enquadramos e colocamos em linguagem determinada questão que estamos tentando lidar, é mais de meio caminho andado para atrair as melhores soluções.

Apelando para a sua abordagem psicológica, Markman diz sobre a tendênca natural do cérebro de fazer associações com a coisa mais concreta que lhe é automaticamente apresentado. Cita exemplos como pedir para as pessoas pensarem em aniversário ou salada. Traremos automaticamente imagens mentais dessas coisas, como bolos e chapeuzinhos; alfaces e tomates.

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E, da mesma forma, se ao sermos apresentados a um problema, alguém nos conduzir a pensar em um aspecto específico dele, assim o faremos. O que de alguma forma pode ser bom, mas pensando em estratégia é quase sempre uma armadilha.

Talvez o melhor exemplo do texto seja sobre aspiradores de pó. Mais precisamente, os “ciclones industriais”, invenção de James Dyson que livrou os aspiradores modernos dos antigos sacos que retinham o pó. Eles criam um movimento circular na massa de ar que ergue as partículas por força centrífuga e as isola.

Markman lembra como esse mercado de aspirador sempre foi sobre ter melhores sacos. Porque provavelmente eles enunciavam o problema de forma a perguntar como ter sacos cada vez melhores e mais eficientes. A lógica dos sacos é que o ar passa pelos seus “poros” e a sujeira fica no tecido.

Porém, pensando de forma mais ampla na lógica de um aspirador, a ideia é que ele suga uma mistura de sujeira e ar e tem de separá-los. Enunciando o problema dessa maneira, nem mencionamos o saco, deixando implícito que o problema está na separação de sujeira e ar e pode haver outras formas de fazer. Se enunciamos a partir do saco, nossa cabeça vai criar associações diretas e específicas nele, o que não vai nos permitir pensar em outras coisas.

Como Markman mesmo diz no texto, não há enunciado ideal, mas essa noção de pensar de forma um pouco mais ampla já é uma boa dica. E outra dica é enquadrar as palavras da maneira que você imagina que as associações corretas podem surgir da cabeça das pessoas. No fim, é um exercício de craft e de lnguagem que é essencial, já que, como dito, é a matéria prima maior do que estratégia pode ser, dado seu caráter abstrato. 

Markman termina o texto com uma imagem interessante, sobre como sempre somos demandados por pensar fora da caixa, mas como o ideal mesmo seria pensarmos na caixa e em como criar a melhor descrição possível dela para que isso nos ajude a resolver melhor o problema. Faz todo sentido.