Refletindo sobre mudanças

Heráclito, o filósofo pré-socrático, proclamou há milhares de anos que “a mudança é a única constante na vida”. Essa afirmação ressoa profundamente nos negócios contemporâneos, onde a estabilidade é uma ilusão e a adaptação é uma necessidade inevitável. Nos mercados voláteis e na paisagem empresarial em constante evolução, essa máxima de Heraclito se manifesta de maneiras tangíveis e impactantes.

Considere o mercado de tecnologia, por exemplo. Empresas que antes lideravam o setor podem rapidamente ser ultrapassadas por concorrentes mais ágeis e inovadores. A rápida ascensão e queda de gigantes tecnológicos como Nokia e BlackBerry são testemunhos vívidos da efemeridade do sucesso no mundo dos negócios modernos. O que uma vez foi considerado imutável torna-se obsoleto em um piscar de olhos, exigindo que as empresas se adaptem continuamente ou enfrentem a extinção.

Além disso, a globalização e a revolução digital têm redefinido as regras do jogo empresarial. As empresas agora enfrentam mudanças sísmicas em tempo real, impulsionadas pela inovação tecnológica e pela interconexão global. Um tweet pode disparar uma crise de reputação; uma nova startup pode transformar uma indústria inteira da noite para o dia. Aqueles que resistem à mudança são rapidamente deixados para trás, enquanto os que abraçam a mudança prosperam.

Empresas que entendem e abraçam a filosofia de Heraclito têm uma vantagem competitiva. Em vez de resistir ao fluxo constante da mudança, elas aprendem a surfar suas ondas, ajustando-se e evoluindo conforme necessário. A agilidade torna-se uma habilidade essencial; a capacidade de pivotar rapidamente em resposta às demandas do mercado e às tendências emergentes é crucial para a sobrevivência e o sucesso a longo prazo.

No entanto, é importante notar que a mudança nem sempre é fácil. Muitas vezes, está associada a incerteza e desconforto. A resistência à mudança é uma força poderosa que pode sabotar até mesmo as melhores intenções empresariais. No entanto, como Heraclito nos lembra, a mudança é inevitável; portanto, é melhor abraçá-la e aprender a navegar em suas correntes turbulentas.

 

Quando e pra quê mudar?

As empresas estão constantemente sujeitas a mudanças, e essas mudanças podem ser motivadas por uma variedade de razões. Uma das motivações comuns para a mudança organizacional é a necessidade de acompanhar o avanço tecnológico. Com o rápido desenvolvimento da tecnologia, as empresas muitas vezes precisam incorporar novas tecnologias para se manterem inovadoras e competitivas. Isso pode envolver a automação de tarefas, a introdução de novos softwares ou o desenvolvimento de novas estratégias.

Além disso, mudanças estruturais são frequentemente implementadas em resposta a eventos como aquisições, crescimento organizacional, mudanças na liderança ou gestão ineficaz. Essas mudanças podem incluir a realocação de pessoal, a criação de equipes de alto desempenho ou a simplificação de processos para aumentar a eficiência.

A cultura organizacional também pode ser uma área de foco para mudanças. Às vezes, as empresas buscam promover novas atitudes que reflitam melhor seus valores fundamentais, enquanto outras vezes uma mudança cultural é desencadeada por alterações em políticas, estrutura ou estratégia. Redefinir visões e missões pode ajudar a promover um ambiente de trabalho mais saudável e alinhar as estratégias da empresa com seus valores.

Operacionalmente, as empresas podem implementar mudanças para melhor atender aos seus objetivos, seja atualizando processos, introduzindo novas tecnologias ou produtos, ou melhorando a comunicação e o trabalho em equipe.

Além disso, as empresas também podem ser impulsionadas por mudanças adaptativas, reativas ou antecipatórias. A mudança adaptativa envolve tomar decisões proativas em resposta a circunstâncias externas ou internas, enquanto a mudança reativa ocorre em resposta a eventos inesperados. Por outro lado, a mudança antecipatória é planejada com antecedência, permitindo que a empresa se prepare para enfrentar futuros desafios.

Independentemente do tipo de mudança, há uma série de benefícios associados a ela. Isso inclui melhorias na eficiência operacional, sensibilidade às necessidades da equipe, relevância de mercado, expectativas realistas, visão e valores coesos, além do fortalecimento dos processos e equipes. Em última análise, a capacidade de uma empresa de reconhecer a necessidade de mudança e adaptar-se adequadamente pode ser crucial para sua sobrevivência e sucesso a longo prazo no ambiente empresarial em constante evolução.

 

Como conduzir o processo de mudança?

Em 1995, John Kotter escreveu o livro “Leading Change”, em que oferece aquilo que se tornou uma espécie de “padrão ouro” para gestão de mudanças até os dias atuais. São 8 passos que oferecem uma estrutura sólida para empresas que buscam transformar sua forma de operar e se adaptar a um ambiente de mercado cada vez mais desafiador. Ao longo dos anos, Kotter observou diversas empresas em suas tentativas de se reinventarem como competidores mais fortes, enfrentando desde grandes desafios até momentos de relativo sucesso. Os oito passos são essenciais para orientar essa jornada de mudança:

Estabelecer um Sentido de Urgência: A mudança começa quando indivíduos ou grupos dentro da empresa reconhecem a necessidade de se adaptar às realidades do mercado e discutem crises iminentes ou oportunidades urgentes. É crucial comunicar amplamente e dramaticamente a urgência da situação para motivar a cooperação de todos os envolvidos.

Formar uma Coalizão Poderosa de Liderança: Uma única pessoa ou pequeno grupo pode iniciar o processo de mudança, mas é fundamental reunir uma coalizão de líderes comprometidos com a transformação. Essa coalizão deve ser poderosa em termos de influência, reputação e relacionamentos para impulsionar a mudança efetivamente.

Desenvolver uma Visão Clara: A coalizão de liderança deve desenvolver uma visão clara do futuro desejado da empresa, comunicando de forma eficaz o rumo que a organização deve seguir. Uma visão compreensível e inspiradora é essencial para alinhar todos os esforços em direção aos objetivos de mudança.

Comunicar a Visão de Forma Abrangente: A visão deve ser comunicada de maneira consistente e abrangente em todos os níveis da organização, utilizando diversos canais de comunicação. Os líderes devem incorporar a visão em suas atividades diárias e comportamentos para inspirar confiança e engajamento.

Remover Obstáculos para a Visão: Identificar e eliminar obstáculos que possam impedir o progresso em direção à visão é essencial. Isso pode incluir mudanças na estrutura organizacional, sistemas de compensação ou até mesmo a remoção de líderes que resistem à mudança.

Planejar e Criar Ganhos de Curto Prazo: Estabelecer metas de curto prazo e celebrar os sucessos ao longo do caminho ajuda a manter o ímpeto da mudança. Esses ganhos tangíveis demonstram que o esforço está produzindo resultados e motivam as pessoas a continuar se envolvendo no processo de transformação.

Não Declarar Vitória Prematuramente: Evitar a armadilha de considerar a mudança completa após os primeiros sucessos. A mudança efetiva requer tempo para se enraizar na cultura organizacional e é importante continuar abordando desafios e promovendo a transformação a longo prazo.

Ancorar as Mudanças na Cultura Corporativa: Para garantir que a mudança seja duradoura, é necessário incorporá-la à cultura da empresa. Isso envolve demonstrar como os novos comportamentos e abordagens contribuem para o sucesso da organização e garantir que as futuras gerações de líderes estejam alinhadas com a visão de mudança.

Seguir esses oito passos tende a ajudar as empresas a enfrentarem os desafios da mudança e a se adaptarem de maneira eficaz a um ambiente de negócios em constante evolução. Ao reconhecer a necessidade de mudança, mobilizar uma coalizão de liderança comprometida e comunicar uma visão clara, as organizações podem construir uma base sólida para o sucesso futuro.

 

Como mudar sem perder o foco na sua missão?

No contexto de mudanças, para muitos líderes empresariais, a preocupação em preservar os valores e a missão original da empresa é uma prioridade constante. E uma das maneiras mais eficazes de garantir a continuidade dos valores e da missão da empresa é torná-los explícitos e tangíveis. Isso inclui não só a redação clara e precisa da declaração de missão e visão da organização, mas também a reiteração constante desses princípios como um mantra interno. Ao fazer isso, os líderes estabelecem um caminho claro para a empresa seguir, mesmo diante das mudanças e desafios do ambiente empresarial. É importante que esses princípios sejam incorporados não apenas nos documentos oficiais da empresa, mas também na cultura organizacional e nas práticas diárias.

Além disso, é fundamental em momentos de mudança reforçar a cultura empresarial de forma que ressoe com os valores e a missão originais da empresa. Isso envolve não apenas comunicar esses princípios aos funcionários, mas também integrá-los em todas as interações e decisões corporativas. Desde o processo de integração de novos funcionários até as políticas e procedimentos diários, é essencial que cada aspecto da empresa reflita e apoie os valores fundamentais estabelecidos pelo fundador.

E, claro, é essencial que os líderes demonstrem comprometimento pessoal com a missão da empresa, liderando pelo exemplo e integrando esses valores em todas as áreas de atuação. Ao fazer isso, os líderes estabelecem um padrão claro de excelência e integridade, inspirando os funcionários a seguirem seu exemplo e a manterem viva a missão da empresa, mesmo diante dos desafios e mudanças do mundo empresarial em constante evolução.

Um case interessante, contado por Michael Schlein na Harvard Business Review é a história da Accion, que nos mostra que é possível realizar essa transição com sucesso, mantendo o foco no objetivo primordial de impactar positivamente a vida das pessoas mais vulneráveis.

Fundada como uma ONG humanitária em 1961, a Accion passou por diversas transformações ao longo dos anos, sempre buscando novas maneiras de atender às necessidades financeiras dos mais desfavorecidos. Inicialmente, seu foco estava em desenvolvimento comunitário na América Latina, mas logo começou a oferecer pequenos empréstimos para indivíduos e pequenos negócios, adotando gradualmente o modelo de microfinanças.

Por décadas, a Accion liderou o campo das microfinanças, construindo instituições financeiras em toda a América Latina. No entanto, com a ascensão da era digital, a organização enfrentou a necessidade de se reinventar. O modelo tradicional de microfinanças, baseado em transações presenciais e em papel, tornou-se obsoleto diante das novas oportunidades oferecidas pela tecnologia. Era preciso decidir: continuar a tradição das microfinanças ou abraçar a inovação digital e expandir o alcance e a eficácia de seus serviços?

Ao optar por seguir um caminho que combinava o melhor dos dois mundos, a Accion tomou uma decisão corajosa. Em vez de abandonar suas raízes nas microfinanças, a organização decidiu modernizar suas operações, incorporando tecnologia de ponta para alcançar um número ainda maior de pessoas desatendidas pelo sistema financeiro tradicional.

Essa transformação não foi fácil. Muitos dentro da organização expressaram preocupações sobre o risco de se afastar do modelo tradicional das microfinanças e perder a conexão com as comunidades mais carentes. No entanto, a Accion estava determinada a encontrar uma maneira de avançar sem comprometer sua missão original.

O segredo do sucesso da Accion reside em sua cultura de inovação e experimentação. Desde o início, a organização incentivou uma abordagem de teste e aprendizado, permitindo que seus funcionários explorassem novas ideias e tecnologias. Essa mentalidade aberta e receptiva à mudança permitiu que a Accion abraçasse a revolução fintech sem perder de vista suas raízes nas microfinanças.

Além disso, a Accion adotou uma abordagem multifacetada para sua transformação, reconhecendo que o futuro das finanças inclusivas exigiria uma combinação de modelos tradicionais e digitais. Ao investir em fintechs inovadoras e ao mesmo tempo modernizar as instituições de microfinanças existentes, a Accion garantiu que estaria na vanguarda da revolução financeira, enquanto continuava a cumprir sua missão de servir os mais necessitados.

Hoje, a Accion é reconhecida como uma líder global em inclusão financeira, aproveitando o poder da tecnologia para criar impacto em escala. Sua história de transformação é um testemunho inspirador de como uma organização pode evoluir e se adaptar às mudanças do mundo, permanecendo fiel aos seus princípios e valores fundamentais. Ao olhar para o futuro, a Accion está preparada para continuar sua missão de capacitar os desfavorecidos, aproveitando as oportunidades oferecidas pelo mundo digital em constante evolução.

 
 

A capacidade de adaptação é crucial para o sucesso das empresas em um mundo empresarial em constante transformação. O exemplo da Accion é apenas um entre muitos que demonstram como as organizações podem evoluir e prosperar mantendo-se fiéis às suas missões originais. Ao abraçar a inovação e promover uma cultura de experimentação, as empresas podem enfrentar os desafios da mudança sem perder de vista seus valores fundamentais. É esse equilíbrio entre tradição e inovação que permite às empresas não apenas sobreviver, mas também prosperar em um ambiente competitivo e dinâmico. Ao reconhecer a necessidade de mudança e adotar uma abordagem flexível e adaptável, as empresas podem construir uma base sólida para o sucesso futuro, mantendo-se verdadeiras à sua essência.