Good to great: como chegar lá?

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Um dos maiores clássicos contemporâneos da administração [gestão, management, como queira] é o livro Good to Great de Jim Collins.

E provavelmente grande parte desse sucesso tem a ver com uma pergunta interessante, instigante, que desperta uma curiosidade real em quem se interessa pelo assunto: o que distingue as empresas boas das “incríveis” [na falta de tradução melhor para “great”]. No começo do livro, Collins já mostra a que veio: 

“We don’t have great schools principally because we have good schools. We don’t have great government, principally because we have good government. Few people attain great lives, in large part because it is just so easy to settle for a good life. The vast majority of companies never become great, precisely because the vast majority become quite good – and that is their main problem.”

É um ponto de vista muito fácil de se relacionar e que suscita uma questão difícil de responder.

Mas uma pergunta provavelmente não levaria Mr. Collins ao sucesso por conta própria. Um dos grandes trunfos do livro é uma pesquisa extensa que ele e sua equipe fizeram sobre 11 empresas, que largaram do mesmo lugar e tiveram destinos muito diferentes. Há casos menos conhecidos para o público brasileiro como o laboratório Abbott e Upjohn, mas há outros bem conhecidos como Gillete, Kimberly Clarck ou Phillip Morris.

E é buscando analisar os padrões dessas histórias é que ele tenta responder a pergunta: o que leva alguém do bom para o incrível.

E isso resulta em um framework, que é a linha mestra do livro, e cada segmento é dedicado a explicar, ilustrar e trazer cases para cada parte do esquema.

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Vamos tentar dar uma geral aqui em cada pedaço, certamente sem a profundidade necessária, mas para dar um pequeno sabor sobre os principais insights do livro.

Olhando de forma mais macro, Collins detectou que há sempre um processo de se colocar na trilha do crescimento para se tornar uma empresa incrível, que ele chamou de Build Up, até que se encontra um ponto de inflexão que faz a empresa ter um salto de qualidade e deslanchar, que ele chamou de Breakthrough.

A segunda questão é a ideia de uma cultura geral de disciplina. Para Collins, essa é uma chave que destrava muitos e muitos problemas de uma organização. A disciplina promove deshierarquização, desburocratização, autonomia, velocidade e foco. Ele divide em três grandes blocos:

Na fase do build up temos:

A disciplina das pessoas, que é sobre encontrar os líderes certos e os times certos

A disciplina de pensamento, que é sobre encarar os fatos brutais e ter um set de valores

Na fase do breakthrough, é necessária a:

A disciplina de ação, que já está na fase do breakthrough e é o ambiente em que as pessoas certas colocarão em prática seus valores, de forma autônoma e livre.

E, por fim, há a “Flywheel”, que é um processo intencional de entender constantemente as ações que precisam ser feitas para incrementar os resultados e executá-las uma a uma, até que se atinja o breakthrough.

Dando um duplo clique em cada uma das “disciplinas”, temos:

  

BUILDING UP I: AS PESSOAS

Um dos pontos mais legais do livro é essa noção de Collins de que nada é mais importante que as pessoas. E que antes de qualquer coisa, é papel de uma empresa que está na rota de ser incrível trazer pessoas igualmente incríveis, independente do que elas vão fazer na sua empresa. Ele resume bem esse pensamento na frase:

“Eu não sei onde nós deveríamos levar essa empresa, mas eu seque se eu começar com as pessoas certas, fazer a elas as perguntas certas e engaja-las em um vigoroso debate, nós encontraremos uma forma de fazer essa empresa dar certo.”

E um dos aspectos mais importantes nessa busca por pessoas incríveis é o que Collins chama de “Nível 5 de Liderança”, que remete ao topo de uma escala hierárquica de que o autor cria para distinguir [na base] um líder que é produtivo e aplica seus skills para “fazer a coisa andar”, de um [no topo] líder que constrói grandes coisas misturando uma personalidade humilde com uma “fome” profissional insaciável.  

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Não é o líder “pavão”, showman, que vivem construindo uma imagem para si próprios, surfam nos sucessos e apontam culpados para os fracassos. Pelo contrário, são normalmente pessoas mais tímidas, mais contidas, que querem realizar e não tem necessidade de se vangloriar sobre suas conquistas.

 

BUILDING UP II: O MINDSET

Em termos de mindset, o que Collins bate bastante na tecla e é uma das grandes coisas que sobram do livro é a capacidade das empresas de confrontarem sem medo os fatos mais brutais sobre o seu mercado, sua performance e suas limitações. É aceitar a realidade, nua e crua. Porém, com um detalhe importantíssimo: não perder de maneira nenhuma a fé de que o quadro pode e vai ser revertido. 

Aqui ele evoca o Paradoxo de Stockdale, militar americano brutalmente torturado na guerra do Vietinan, que só conseguiu sair de lá com essas duas convicções perfeitamente equilibradas: ele estava na pior situação da sua vida, não tinha uma saída fácil e provavelmente demoraria muito mais do que ele gostaria para sair de lá. Mas ele iria sair, com certeza. Enfrentar a realidade e fé.

Uma das ilustrações desse ponto no livro é o caso do laboratório Abbot, que em algum ponto olhou para o lado, onde estava a Merck, seu principal concorrente e aceitou: eles estão muito a frente, nós não vamos conseguir bater de frente. “Seria como um time de futebol americano de High School tentando vencer o Dallas Cowboys”.

Mas isso não os fez desistir, mas sim mudar sua rota. Passaram a se concentrar em um nicho que eles podiam dominar. Eles saíram do seu core business de farmacêutica e passaram a focar em itens de menor custo dentro de health care, como devices para diagnósticos e produtos nutricionais. E esse foi o principal passo do build-up para eles poderem dar o salto. A comparação é o laboratório UpJohn, que nunca confrontou esse fato da superioridade da Merck, e continuaram batendo de frente até falirem.  

O segundo conceito importante que também tem a ver com esse é o que Collins chama de “Hedgehog Concept”. Ele faz uma metáfora entre uma raposa – que é um animal inteligente, astuto, malicioso – com um ouriço, que parece ser um animal meio tonto, devagar. É uma criatura simples, que sabe fazer praticamente só uma coisa: envolver-se em uma bola para poder se proteger. Mas ela faz isso muito bem e aposta nisso para a sua sobrevivência.

Partindo dessa metáfora, Collins defende que é isso que empresas incríveis fazem: encontram algo que sabem fazer muito bem e se aperfeiçoam nisso constantemente, trazendo simplicidade para a sua operação. Até porque, segundo ele, é incrivelmente fácil uma empresa se distrair com atividades marginais e se perder.

O exemplo aqui é Wallgreens, a grande rede de farmácias americana, que só conseguiu se preparar para um grande salto definindo que não queria ser a farmácia com maior conveniência dos EUA. Não a mais pemium ou a mais barata. A mais conveniente. E isso levou eles a tomarem uma série de decisões, como a localização dos pontos de venda, e uma métrica essencial: o lucro por “visita” de cada cliente. A estratégia seria estimular os clientes a sempre saírem com mais alguma coisa da loja do que eles vieram comprar. E virou o que virou: não só a maior como uma grande geradora de tendências no segmento.

Para encontrar seu Hedgehog, há três perguntas centrais que toda empresa deve se fazer:

O que somos apaixonados por fazer?
No que nós podemos ser melhores do que qualquer um?
O que gera receita e lucro?

Achando um ponto de intersecção entre tudo isso, você achou também sua bola do ouriço: atenha-se a isso, aperfeiçoe-se nisso que você estará no melhor caminho para ser uma empresa incrível.

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BREAKTHROUGH: A AÇÃO 

Passado todo o build-up, é hora de colocar as pessoas certas, com o mindset certo, dentro do seu Hedgehog para dar todos os passos necessários para dar o salto de crescimento e se tornar uma empresa incrível. 

Aqui, as questões chave são criar um cultura de disciplina em que há liberdade e accountability para que as pessoas façam o que precisa ser feito, mas idealmente dentro de um processo da empresa, que funcione de forma mais sistemática.

A tentativa aqui é criar uma cultura forte, um foco total no fortalecimento e aperfeiçoamento do Hedgehog, colocando as pessoas no mesmo mindset, mas dando liberdade para que elas criem. Afinal, partimos do princípio que são as pessoas “certas” que estão no barco.

Além disso, esse é o momento de investir em tecnologias que podem aprofundar e acelerar a trilha de crescimento. O pensamento aqui é muito orientado para inovação, pioneirismo, eficiência, automação, MAS, sem esquecer que tudo isso deve estar à serviço da construção do seu conceito único, do seu foco, daquilo que se acredita que a empresa sabe fazer e vai se concentrar em fazer. A tecnologia em si não leva ninguém muito longe. Ela precisa estar sempre à serviço de algo. No caso aqui, nosso Hedgehog.


Demos uma geral aqui na proposição de Jim Collins, mas vale muito a leitura do todo, com muito mais exemploe e aprofundamento. É um material muito rico em insights sobre como liderar uma companhia em dreção ao sucesso, mas de uma maneira bem pé no chão, sem promessas mágicas ou papo furado de coaching. Não virou o sucesso que virou à toa.