O Safari da Estratégia de Henry Mintzberg

Henry Mintzberg pode ser considerado um dos “founding fathers” da disciplina de estratégia, ao lado de nomes como Bill Bain, Bruce Henderson e Michael Porter. E há pouco mais de 10 anos, escreveu uma espécie de compêndio para falar sobre a disciplina de maneira mais ampla e até retrospectiva, considerando todo seu histórico de décadas na área. A obra se chama Strategy Safari: a guided tour through the wilds of strategic management (Safári de Estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico, em português), juntamente com Bruce Ahlstrand e Joseph Lampel.

A obra destaca fundamentos, premissas e práticas de 10 escolas de administração estratégica, onde cada uma delas é avaliada quanto à sua contribuição para o segmento em relação às suas limitações. Uma leitura clássica sobre estratégia empresarial, que permite uma visão geral sobre os pontos de vista pelos quais a estratégia é considerada.

Mas, não é só isso. As linhas escritas também dão a possibilidade a empresários, gestores, negócios, administradores e estrategistas de refletir e adotar estratégias que mais vão ao encontro com o mercado e a estrutura do seu próprio negócio.

 Diante disso, o livro se estabelece como uma espécie de guia que fornece críticas às escolas de planejamento estratégico, destacando as principais ferramentas utilizadas nesse universo e as discussões sobre sua eficácia.

Um olhar geral

A obra dialoga sobre como a estratégia se tornou um comportamento de longo prazo, onde planejamos o futuro com base na construção do passado. Nesse meio tempo, surge uma questão importante: “As estratégias realizadas sempre foram intencionais?”. E a verdade é que, na prática, nem sempre é assim. Por isso, ele classifica três tipos de estratégia: deliberada (executadas); emergente (padrão executado não foi pretendido anteriormente); e não realizada. 

Claro que a melhor prática é a estratégia intencionalmente pensada e executada e é a partir daí começamos a analisar pontos específicos desse processo:

 

Concepção

Para que uma estratégia comece a ver a luz do dia, é importante nortear-se com base em pelo menos 4 critérios: consistência, que se refere à solidez dos objetivos; consonância, que significa a capacidade de reagir ao ambiente; vantagem, que define o diferencial competitivo; e viabilidade, que acontece se a estratégia for financeiramente sustentável.

 

Dimensões fundamentais

O modelo básico de planejamento estratégico explica como construir cenários para auxiliar na tomada de decisão, identificando as principais “forças motrizes”, que são:

  • Dinâmica social: questões relacionadas a hábitos de consumo, estilo de vida e valores;

  • Questões econômicas: tendências macroeconômicas que podem influenciar seu negócio;

  • Questões políticas: assuntos eleitorais e legislativos;

  • Questões de tecnologia: novas tecnologias que podem impactar seus negócios.

Segundo os autores, levar em consideração esses aspectos significa basear um planejamento no longo prazo e, assim, diminuir as chances de estratégias imediatas de impulso que podem acabar sendo voos de galinha. E, claro, sempre ficar atento às mudanças nessas dimensões, já que [especialmente hoje] tudo é muito dinâmico e precisa ser adaptado rapidamente.

 

Mentalidade, processo emergente e negociação

Os estrategistas formulam suas estratégias com base em suas experiências. Depois, a estratégia precisa assumir um processo de aprendizagem de longo prazo, cujo líder deve coordenar. No entanto, mesmo que o processo se desenvolva dentro da organização, ainda está sujeito a ser restrito se colocar mais ênfase no hoje do que no amanhã. No fundo, estratégia é sobre uma visão de futuro.

Até por isso, uma boa estratégia, incisiva e relevante, vai encontrar dificuldades políticas pelo caminho em qualquer organização. Porque ela necessariamente vai chacoalhar as estruturas e propor mudanças na maneira como as coisas são feitas – o que sempre gera um natural desconforto. 

A força que altera a configuração estável das empresas. As mudanças de cima para baixo começam com a reestruturação da empresa, esmagando burocracias desnecessárias, capacitando funcionários e refinando para sustentar a vantagem competitiva. De outro ângulo, mutações de baixo para cima sugerem que pequenas mudanças na organização levam ao processo de transformação, de forma que elas partem dos funcionários, descentralizando a figura central do líder.

Em tese, uma estratégia é baseada em crenças coletivas, que impactam a forma como os recursos são utilizados para gerar vantagem competitiva. Por isso, a cultura passa a ser a grande influenciadora das decisões organizacionais. Para superar esses conflitos, é preciso se enquadrar em um ambiente de aceitação, flexível e inovador.

 

A besta inteira

“Quão complexa deve ser uma boa estratégia?”

“Até que ponto uma boa estratégia deve ser integrada?”

“Quão boa deve ser uma boa estratégia?

“Até que ponto uma boa estratégia deve ser centralizada?”

Essas questões fazem revisar todo o “animal” da estratégia, levando em conta tudo o que foi falado e abordado anteriormente.

Aqui, para contextualizar as metáforas da besta ou do animal, os autores usam a analogia dos cegos tentando descrever um elefante: a história em que aquele que está sentindo sua cauda pensou que era como uma corda, aquele que sentiu sua perna pensou que era como uma árvore, aquele que sentiu sua presa pensou que era como uma lança, etc.). Moral da história, não dá para descrever algo muito grande, porque cada um consegue se apropriar apenas de um pedaço dele. Por isso, segue-se com a análise das diferentes abordagens para o planejamento estratégico.

 

AS 10 ESCOLAS DE PLANEJAMENTO ANALISADAS

A obra possui na essência uma descrição detalhada de 10 escolas de planejamento. Elas são definidas aqui em duas grandes categorias. As prescritivas, que identificam direções de ação por parte da empresa a partir de uma avaliação da situação atual e do ambiente em que opera. E as descritivas – razões históricas pelas quais uma empresa está onde está em determinado momento.

  1. Escola de Design: formação da estratégia como processo de concepção, combinando a situação interna da organização com a externa do ambiente, projetando a estratégia da organização para representar o melhor ajuste possível.

  2. Escola de Planejamento: a formação da estratégia é vista como um processo formal, que segue um conjunto rigoroso de etapas desde a análise da situação até o desenvolvimento e exploração de cenários.

  3. Escola de Posicionamento: processo analítico que coloca o negócio dentro do contexto da indústria em que está inserido e como a organização melhora seu posicionamento competitivo neste âmbito.

  4. Escola Empreendedora: formação da estratégia como processo visionário, ocorrendo na mente do fundador ou líder de uma organização.

  5. Escola Cognitiva: baseada na ciência do funcionamento do cérebro, considera a estratégia como um processo mental e analisa como as pessoas percebem padrões e processam informações.

  6. Escola de Aprendizagem: formação da estratégia como processo emergente, onde a administração de uma organização presta atenção ao que funciona e ao que não funciona, estabelecendo lições em seu plano de ação.

  7. Escola de Poder: processo de negociação entre os detentores de poder dentro da empresa e/ou entre o negócio e as partes interessadas externas.

  8. Escola Cultural: processo coletivo envolvendo grupos e departamentos da empresa; a estratégia desenvolvida é um reflexo da cultura corporativa.

  9. Escola Ambiental: processo reativo; uma resposta aos desafios impostos pelo ambiente externo.

  10. Escola de Configuração: processo de transformação da organização de um tipo de estrutura de tomada de decisão para outro.

Assim como nenhuma das descrições do elefante dos cegos é completamente adequada, nenhuma dessas escolas é completa por si só. Cada uma oferece conceitos úteis e pontos fortes, mas também tem suas desvantagens. É porque aqui o objetivo não é identificar qual aspecto da gestão estratégica é a melhor representação do todo, mas entender como todos contribuem para a totalidade da disciplina. Isso expande a perspectiva do estrategista sobre a riqueza da gestão estratégica e permite considerar as abordagens que podem ser aplicadas.

 

5PS DA ESTRATÉGIA E POR QUE O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO É BENÉFICO A EMPRESAS

Um dos destaques da obra de Mintzberg é sua sistematização da disciplina nos seus famosos 5 Ps. Na prática, são cinco maneiras distintas de pensar sobre as características essenciais do planejamento estratégico, elencados como:

P1: estratégia como um plano, um guia para um curso de ação, um caminho de um estado atual para um estado final futuro desejado.

P2: estratégia como um padrão; uma consistência de comportamento ao longo do tempo.

P3: estratégia como posição para a localização de produtos específicos em mercados específicos.

P4: estratégia como perspectiva, representando-a como uma filosofia particular do negócio em termos de interação com o cliente ou a forma em que bens/serviços por meio de uma manobra específica, destinada a enganar concorrentes ou oponentes.

P5: estratégia como uma manobra [ploy], buscando sempre surpreender a concorrência com movimentos inesperados que mudam a forma como o jogo é jogado.

 

NEM TUDO SÃO FLORES

Uma das coisas mais interessantes da obra de Mintzberg é que ela não ilude o leitor de que tudo são flores no mundo da estratégia. É possível analisar, do início ao fim do livro, os motivos pelos quais o planejamento estratégico é considerado fundamental para qualquer empresa, mas sem deixar de apontar os contrapontos possíveis. Estratégia é ótimo, mas há pontos de atenção que não podem ser desconsiderados.

  • Define a direção. Mas, mesmo que seja benéfica, é perigoso quando os problemas que um plano pode impor a uma organização, dificultando a avaliação de novas possibilidades.

  • Concentra esforços, mas há risco de que os gerentes fiquem presos a uma forma particular de pensamento, perdendo novas oportunidades.

  • Estabelecer definições claras do que a empresa é ou não é, mas há um perigo de ignorar a riqueza da diversidade inerente à qualquer organização, podendo incorrer em estereótipos simplistas.

  • Cria consistência, mas gera dificuldade de reação rápida e adaptação à novas realidades.

Para que se aproveite muito mais os prós do que os contras de criar uma cultura estratégica, é importante adotar boas práticas como ter um senso crítico enorme em relação às próprias decisões. É fundamental analisar sempre os pontos negativos de uma estratégia e não só ficar inebriado pelos positivos, ficando cego nas próprias crenças. Assim como não deixar que a estratégia se concentre só na liderança, mas permeie toda a organização, deixando a cultura corporativa pode moldar as estratégias de uma empresa. E, claro, sempre estar mais que consciente das incertezas. Estratégia está longe de ser ciência exata. Está muito mais para mitigação de riscos.

Mas, no fim do dia, o fato é que planejar estratégias é o ponto de partida para todas as ações que uma marca deve realizar para conquistar um futuro próspero, já que é o caminho mais eficiente para lidar com o bem mais precioso das organizações que são seus recursos [tempo, dinheiro, tecnologias, pessoas etc.]. Estando consciente das dificuldades e idiossincrasias, é certamente a melhor aposta que se pode fazer.


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